A transformação digital é inexorável !

É necessário reverter o cenário atual da TI operacional. Olhar e gerenciar a própria TI como um negócio, a tornando não apenas um meio de transformar os processos de negócio

Cezar Taurion *

Publicada em 18 de fevereiro de 2015 às 07h51

Em agosto do ano passado escrevi um artigo abordando o paradoxo do CIO: como inovar e manter a operação do dia a dia? O resultado foi interessante. Foram muitos comentários, a maioria concordando e sentindo até que o artigo deu voz aos seus pensamentos. Claro, outros não concordaram. Mas, o debate em si foi enriquecedor. E se acende ao ler duas pesquisas muito interessantes que abordam o tema.

Um estudo da Deloitte apontou que a transformação digital embute a proposta que no final toda empresa será uma empresa de tecnologia e esta mudança é desafiadora para as áreas de TI e os CIOs. O estudo mostrou que para acompanhar este processo os “gestores de tecnologia precisam correr mais riscos, assumirem uma postura mais empreendedora e passar a oferecer uma TI voltada mais para fora do que para dentro”.

Existem barreiras, muitas delas culturais, como as empresas e muitos CIOs ainda verem a entrega de resultados operacionais como a principal responsabilidade de TI. Este cenário, bastante comum, é sintoma que muitos executivos de negócio, como os CEOs, continuam vendo a TI mais como operação e não como a escolha natural para promover inovação em suas empresas. Em consequência os CIOs, apesar de afirmarem em pesquisas que inovação é sua prioridade estratégica, se veem pouco envolvidos com ela.

Juntando este estudo com uma pesquisa do Gartner, que indicou que quase metade das empresas na América Latina não veem os novos conceitos tecnológicos (computação cognitiva, Internet das Coisas, impressão 3D, etc) como algo relevante e portanto ainda fora do horizonte de seus projetos, fica claro que TI é olhada de forma ainda operacional, com visão de curto prazo. A pesquisa mostrou outro dado preocupante, que muitas áreas de TI não estão instrumentadas para a transformação digital: ”digital trata de experimentação, mas as empresas não tem a política para isso ou uma postura para que sejam tolerantes a falhas”. Inovar é muitas vezes falhar.

Do artigo de agosto para cá comprovei, por vivências com vários CIOs, que realmente muitos deles sofrem com a percepção de suas empresas que TI é operacional, não sendo chamada para contribuir estrategicamente para a diferenciação do negócio. Aliás, são poucos os casos onde TI define em conjunto a estratégia do negócio (ainda fazem seus PDTI – Plano Diretor de Tecnologia da Informação – a posteriori das definições estratégicas) e mais raros ainda os casos onde o CIO tem assento no board de executivos. Daí o paradoxo: contradições entre a importância crescente da tecnologia para as empresas e a TI vista como operacional e não como alavancadora de inovações tecnológicas. A contradição fica nítida quando entendemos que o processo de transformação digital implica naturalmente que TI passa a ser o negócio, o que contradiz o cenário das empresas cujos CIOs são mantidos à distância, cuidando da operação, com uma clara distinção entre TI e o negócio.

Infelizmente, para elas, o processo de transformação digital é inexorável e as mudanças serão contínuas. Recomendo a leitura do livro “The New Normal” de Peter Hinssen, que mostra nitidamente que no mundo hiperconectado, as velocidades de resposta às demandas do mercado e o uso da tecnologia como parte natural e integrante dos processos e produtos da empresa serão nada mais que obrigação, naturais e esperadas pelos clientes.

Entendo que é necessário reverter o cenário atual da TI operacional. A transformação digital não espera pelos atrasados. O que os CIOs podem fazer? Se eles continuarem a manter suas parcas iniciativas de inovação na fila de projetos da área de TI, eles simplesmente nunca terão prioridade. Basta ver que muitas empresas, diante do cenário econômico adverso, cancelam imediatamente suas primeiras ações de Big Data, colaboração, Internet das Cosias e assim por diante. Neste contexto econômico aumentam a cobrança pela sustentação das operações e desaceleram qualquer tentativa de inovar.

A mudança impõe uma nova abordagem para TI. Passando as atividades de menor valor agregado para parceiros de negócios, reduzindo seu envolvimento nas questões operacionais, liberando mais tempo para interagir com os executivos de negócio, simplificando sua operação e embutindo os novos conceitos tecnológicos como base natural e primordial de seus novos projetos, o CIO se transmuta em maestro de soluções, liderando e impulsionando a transformação digital.

Para isso não basta querer. Deve criar e disseminar a cultura de inovação na área de TI, até a incluindo na sua missão. Aliás, como sugestão, uma missão de uma área de TI que vi no exterior: ” Our mission is to transform technology to be enabler of brand differentiation”.

O CIO deve também assumir postura evangelizadora, mostrando seu lado visionário e como estas visões contribuirão para o negócio e poderão influenciar a estratégia da empresa. Para ser mais ouvido deve fazer a TI implementar soluções que estejam as mais próximas possíveis de onde a geração de receita da empresa acontece. É essencial quebrar a barreira tradicional da “TI e o negócio”, mudando para “TI é o negócio”.

Esta mudança de mind set exige mudanças nas atitudes. Mais comunicação, mais interação com os executivos de negócio, menos hermetismo tecnológico, mais tempo dedicado em eventos e contatos do seu setor de indústria e menos com fornecedores de TI.

Implica também olhar e gerenciar a própria TI como um negócio, a tornando não apenas um meio de transformar os processos de negócio com automação (como os ERP) mas mudando o próprio negócio, com iniciativas transformadoras de Big data, mobilidade e Internet das Coisas. Aliás, recomendo enfaticamente a leitura do livro “World Class IT: Why Businesses Succeed When IT Triumphs” de Peter High, que aponta caminhos para o CIO se transformar em um Chief Innovation Officer. Um texto é significativo:” With the rise of social media, the consumerization of IT, Big data, and business intelligence, IT-centered innovation is growing. IT leaders are well positioned to sit at the hub of discussion with the heads of business units and departments about the source of innovation and the technology to support them”. A mensagem é clara: o futuro do CIO e da TI é ser o negócio. E o trem já está saindo da estação…

(*) Cezar Taurion é é CEO da Litteris Consulting, autor de seis livros sobre Open Source, Inovação, Cloud Computing e Big Data

Fonte: newsletter CIO/Computerworld